A Influência do Romantismo
A Influência do Romantismo na interpretação subjetivista de F. Schleiermacher
O Romantismo é algo difícil de
definir. A melhor maneira de defini-lo talvez seja como uma reação contra o
Iluminismo, especialmente contra a alegação de que a realidade pode ser
apreendida pela razão somente.[1] Desta forma o Romantismo se encontrava
insatisfeito em relação às doutrinas tradicionais da teologia e ao mesmo tempo com
as idéias do Iluminismo de descobrir o universo. O Romantismo pregava que:
A razão
ameaça limitar a mente humana àquilo que pode ser deduzido; a imaginação é
capaz de libertar o espírito humano dessa prisão que lhe é imposta por si
mesmo, permitindo-lhe descobrir a realidade de uma forma nova e mais profunda,
“algo” indefinido e intrigante que é possível ser percebido no mundo das realidades
diárias. O infinito faz-se presente no finito e dá-se a conhecer por meio dos
sentimentos e da imaginação.[2]
Desta forma, enquanto o Iluminismo voltava-se para a razão e para a mente humana,
o Romantismo por sua vez, ressaltava os sentimentos humanos, reputados como
“uma chave para todos os mistérios”. Foi por esse motivo que o Iluminismo
condenou a imaginação e o sentimento como “heresias”, pelo fato de que estes
aspectos ofereciam acesso ao “Idealismo mágico” do infinito. Assim a “subjetividade
e a intimidade eram agora vistas como espelhos do infinito”. [3]
Schleiermacher foi o primeiro a
formular a questão hermenêutica de forma distintiva dentro do Romantismo. A
história da igreja relata discussões da hermenêutica e da exegese com regras e princípios
estabelecidos. Até o século XIX, os que se preocupavam com a hermenêutica eram
os teólogos, mas não havia uma matéria específica dentro da filosofia que
cuidasse da hermenêutica. Schleiermacher
desenvolveu também uma concepção da psicologia do autor, que são as
características subjetivas não reveladas do autor que estão atrás do texto. Desta
forma ele abre a possibilidade para a subjetividade de interpretação. Também,
ele foi o primeiro pensador a formular de maneira clara o “círculo hermenêutico”.[4] Nesta parte se verá a raiz dessas concepções
dentro do Idealismo Romântico.
Na
obra de Schleiermacher “Hermenêutica e Criticismo“ há uma definição que demarca
a intenção dele em delinear sua hermenêutica unindo-a ao criticismo e isolando
a hermenêutica como disciplina filosófica. Ele inicia sua introdução da
seguinte forma:
Hermenêutica
e Criticismo são disciplinas filosóficas: ambas são teorias que começam juntas
porque a prática de uma pressupõe a outra. A primeira é geralmente arte do entender
particularmente o discurso escrito de outra pessoa e a segunda é a arte de
julgar corretamente e estabelecer a autenticidade de textos e partes de texto
de adequada evidência e data. [...] a prática do criticismo pressupõe
hermenêutica.[5]
Nesta obra há uma reação dele ao
racionalismo que por um lado sustenta e afirma o criticismo e por outro o que
foi chamado posteriormente de “concepção Romântica” da interpretação.[6] Há evidências de que o Método Histórico Crítico está nutrindo a
declaração acima. Grenz afirma que Schleiermacher foi o primeiro a sugerir que
os textos da Escritura não eram tratados teológicos sistemáticos e sim produtos
de mentes criadoras em respostas a determinadas situações.[7]
Essa concepção Romântica, segundo
Tillich, não foi desenvolvida no século XIX e sim, dentro do pensamento
humanista desenvolvido desde a Renascença, sobre o Romantismo, diz:
Podemos,
assim, dizer que em Goethe, os motivos de Nicolau de Cusa, de Giordano Bruno, e
do Earl de Shaftesbury se combinaram para formar uma imagem da realidade que
seria mais tarde, na segunda metade do século XIX, superada pelas ciências
empíricas. [...]. A filosofia Romântica, dessa maneira, substituía a religião
pela intuição estética. Sempre que alguém disser que arte é religião, estamos
na esfera da tradição Romântica.[8]
Esta concepção do Romantismo tinha
duas premissas importantes para a hermenêutica de Schleiermacher: a primeira é
a concepção Romântica do infinito dentro do finito. Isto Schleiermacher fez sem
levar em consideração a teologia protestante de sua própria tradição luterana.[9] Ele usava o vocabulário da teologia antiga com
uma nova concepção.[10] Seu conceito de um “ser superior” vai além da
finitude,[11] isto é, além da natureza. Isto é, em parte pela tradição protestante e pelo
diálogo com a filosofia do Romantismo. Nesta concepção não há lugar para uma
revelação fechada e estática.[12] Durante o Iluminismo, a nova ciência do
criticismo histórico havia levantado questões que desacreditavam a origem da Bíblia
e de Deus.[13]
A segunda premissa estava no
conceito de liberdade autônoma. O pensamento do homem é dinâmico e não se
submete aos padrões convencionais da religião, pensavam os racionalistas. Por
isso os romântico-idealistas como Schleiermacher desenvolveram o conceito da
liberdade dentro deste ideal respondendo aos racionalistas.
Dentro das premissas do infinito e
da liberdade autônoma, Schleiermacher construiu sua teologia da “intuição”.
Esta intuição é baseada em sua proposta do sentimento religioso.[14] Thiselton chama a atenção pelo fato de que esse sentimento religioso não
é algo natural do ser humano, ele diz: “intuição não significa sentido ou
percepção..., mas significa a permissão que a atividade da presença infinita
trabalha no finito ser”.[15] Neste
caso, os estudiosos são quase unânimes em conferir-lhe a posição de “pai da
teologia moderna”, “príncipe da Igreja”, “o mais influente teólogo desde
Calvino”, e o “idealizador da teologia liberal” por cerca de duzentos anos.[16]
O período do Romantismo do século
XIX foi uma reação ao racionalismo frio da filosofia Iluminista.[17] Isto significa que há uma apologia dos
conceitos tais como: Deus, a natureza, o belo, entre outras coisas. Por causa do racionalismo muitas concepções
religiosas estavam sendo desacreditadas. Brown explica a situação de
Schleiermacher como um mediador entre a filosofia e a teologia da seguinte
forma:
Havia
aquela dos Reformadores que baseavam seu ensino na revelação bíblica. E havia
aquela dos filósofos que procuravam elaborar uma teologia natural baseada em
várias deduções lógicas acerca do mundo, [...]. A partir de Tomás de Aquino,
havia aqueles que procuravam combinar as duas abordagens mediante o processo
simples de somá-las. E havia filósofos como Kant que sustentavam que as duas se
cancelavam mutuamente. Por causa da teologia natural, estar podre nos próprios
alicerces era incapaz de sustentar a superestrutura da teologia cristã.
Schleiermacher procurou obter um curso no meio dos dois. Desenvolveu aquilo que
às vezes é chamada de teologia positiva.[18]
[1] Os grandes propulsores do movimento Romântico
na Europa foram os irmãos Friedrish William Schlegel e August W. Schlegel e W.
Wordsword.
[2] MCGRATH, op. cit. p.133.
[3] Ibid. p.134.
[4] THISELTON, Anthony C. op. cit. p. 204.
[5] SCHLEIERMACHER, E. D. F., Hermeneutics
and Criticism and Other Writings. Tradução de Andrew Bowie, New York:
Cambridge University Press, 1998, p. 3, Tradução nossa.
[7] GRENZ, S. J. Pós-modernismo: Um guia filosófico para entender o nosso tempo. São
Paulo: Edições Vida Nova, 1996, p. 143.
[8] TILLICH, Paul, op. cit. p.92 e 94.
[9] Desta forma Schleiermacher incentiva uma
religião natural, isto é, uma religião em que se pode sentir “deus” dentro de
cada ser, contrariando a Reforma que afirmou que é impossível ao ser humano
buscar a Deus através do ser humano natural, isto é sem Cristo, cf. Rm 3:11 e
Ef 2:1-3.
[10] BROWN, Colin. Filosofia e Fé Cristã: Um esboço desde a Idade Média até o presente.
São Paulo: Edições Vida Nova, 1989, p.80.
[11] Desta forma o tema de S. J. Grenz e R. Olson
está correto quando afirmam que estes teólogos-filósofos intentavam reconstruir
a transcendência de Deus destruída pelo Iluminismo empirista. Para mais
detalhes veja cf. GRENZ e OLSON 2003, p. 25-71.
[12] Embora não haja entre os Românticos nada
contra a Escritura, o conceito desenvolvido sobre o “infinito” ultrapassa a
própria Escritura. Para uma exposição deste período veja cf. TILLICH 1986, p. 89-136.
[13] GRENZ e OLSON, op. cit., p.48.
[14] A palavra alemã gefühl traduzida por
sentimento seria a sensação de ficar totalmente dependente de alguma coisa
infinita que se manifesta nas coisas e pelas coisas finitas (GRENZ e OLSON 2001, p. 558). Assim a verdadeira
religião está “na consciência imediata da existência finita de todas as coisas
no infinito e através dele, na consciência de todas as coisas temporais no
eterno e através dele” (GRENZ e OLSON 2003, p. 50).
[15] THISELTON, A. C. op. cit. p. 212, Tradução Nossa.
[16] GRENZ e OLSON. História da Teologia Cristã: 2000 anos
de tradição e reformas. Tradução: Gordon Chown.São Paulo: Vida Nova, 2001, p. 43-44.
[18] BROWN, C. 1989, op.cit., p. 79 sic.
[19] Destaca-se que neste período do Romantismo
Johann Wolfgang Von Goethe (1782-1832) era o grande poeta do momento.
Abstract
The
post-modernity, a daughter of the modern era has suscitasted subjective forms
of interpretation. These forms affect the comprehension of the Holy Scriptures´
texts in many senses, separating its objectivity. The purpose of this thesis is
to elucidate that subjectivity since the Romantic Idealism until our days and
to demonstrate that there are confrontation between both the form of exegesis
and hermeneutics proposed by the Reformation and that subjectivity. At the same
time it intends to question these methods of interpretation and to demonstrate
that the correct interpretation depends on the intension of the Scripture’s
author and of the biblical text, in order to eliminate a incoherence of that
subjectivity.
Key
words: Hermeneutics, Subjectivism, Rationalism, Reformed hermeneutics and
post-modernity.
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